sábado, maio 31, 2025
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Defesa de Bolsonaro pede anulação da delação do Cid e julgamento no plenário

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF), ontem, quinta-feira (6), sua defesa à denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra ele por suposta participação em um plano de golpe de Estado em 2022. Os advogados do ex-mandatário pediram a anulação da delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

Também solicitaram o afastamento do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes da relatoria do caso e o julgamento em plenário da denúncia. Mais cedo, a defesa de Cid reforçou que o acordo não foi firmado sob coação e criticou os demais denunciados que pedem a nulidade do acordo.

“Não é novidade também, que as defesas dos codenunciados alardeiam aos quatro ventos pela imprensa nacional sua nulidade… Essas defesas, afirmam, em sucessivas entrevistas em rede nacional, que Mauro Cid mentiu; que a colaboração não vale, e que, por isso, a prova por ela produzida não tem validade legal”, disse o advogado do militar, Cezar Bitencourt, ao contestar a denúncia da PGR.

Os advogados do ex-mandatário, entretanto, afirmam que se trata de uma “colaboração premiada viciada pela absoluta falta de voluntariedade e de uma colaboração marcada pelas mentiras, omissões e contradições”, citando duas ocasiões em que Cid foi convocado ao STF para se explicar sobre suas declarações.

A primeira ocorreu após a divulgação de áudios pela revista Veja, nos quais ele dizia ter sido coagido pela PF e reclamava da condução do caso por Moraes; a segunda ocorreu após o indiciamento de Bolsonaro pela Polícia Federal, em 21 de novembro de 2024. Sobre os áudios vazados, o tenente-coronel disse que eram apenas desabafos. Depois do indiciamento, ele mudou as versões sobre o que havia relatado na delação após a PF indicar “omissões”.

“Em qual versão devemos acreditar? Na ausência de voluntariedade ou no suposto desabafo? Como confiar num delator que desacredita sua própria delação?”, questionou a defesa de Bolsonaro. “O caso é de rescisão. Nada mais. E ainda que não ocorra a rescisão, o que se ite para argumentar, não é possível acreditar em nenhuma palavra do Colaborador [Mauro Cid]”, acrescentou.

Os advogados também criticaram Moraes por ter conduzido pessoalmente dois depoimentos do militar. “Não há precedente na história desse país de um depoimento de colaboração tomado por um Magistrado, o que, sabemos, só ocorre por ocasião do interrogatório judicial”, disseram.

“Inconsistências na narrativa acusatória”

Para a defesa do ex-presidente, a denúncia formulada pela PGR “esmerou-se em contar uma boa ‘estória’, que alimenta boas manchetes e anima o imaginário popular, mas que não sustenta uma ação penal”. Além disso, os advogados apontam que as “lacunas” da denúncia foram preenchidas pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, com “presunções acerca do comando, da ciência ou a da anuência” de Bolsonaro em relação a todos os atos praticados pelos denunciados.

“A dita sequência de atos que visavam romper a normalidade do processo sucessório refere-se a lives, entrevistas, reuniões. Não há um único ato violento ou ameaçador neste período, requisito essencial para qualquer dos dois crimes contra as instituições democráticas. O enredo criado para sustentar o romance, portanto, não é real”, dizem os advogados.

Defesa alfineta Moraes e diz que juiz não pode ser protagonista do processo

Ao longo da argumentação, os advogados apresentam elementos sobre a necessidade da figura do juiz de garantias. Desse modo, um magistrado seria responsável pelas decisões no âmbito da investigação que se dá ao longo do processo e outro pelo juiz seria responsável por julgar o caso de fato.

“[…] Não foi sem razão que, ao analisar a figura do juiz de garantias, o d. Ministro Luiz Fux destacou que “A legítima vedação à substituição da atuação probatória do órgão de acusação significa que o juiz não pode, em hipótese alguma, tornar-se protagonista do processo” [grifo da defesa].

“Mas e quando essa não é a realidade factual do processo – como no presente caso, no qual inúmeras razões fizeram o magistrado transbordar o seu papel e alijar o Parquet dos autos? […] Então o juízo de garantias se torna uma exigência e mesmo a existência de rito previsto em lei diversa não é suficiente para impedir a aplicação da regra nova à ação penal”, apontam os advogados.

Bolsonaro e os atos de 8 de janeiro

A defesa afirmou que os eventos do dia 8 de janeiro de 2023 “são produto da vontade própria de pessoas que devem responder por seus atos, mas não são (jamais foram) atos direcionados, ordenados ou planejados” por Bolsonaro.

“O vácuo probatório faz com que a denúncia busque criminalizar a atividade política do peticionário em geral, suas opiniões, e a forma como ele se relaciona com sua base eleitoral. Coisa bem diversa seria demonstrar que ele determinou a elaboração e a execução de crimes”, diz a petição.

Denúncia deve ser julgada pelo plenário, diz defesa de Bolsonaro

O advogado Carlos Vilardi, que coordena a equipe jurídica, solicitou que a denúncia seja analisada pelo plenário da Corte, formado por 11 ministros. A princípio, o caso será analisado pela Primeira Turma, como prevê o regimento interno do STF. O colegiado é formado por Moraes e pelos ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Cristiano Zanin.

Para a defesa, “parece ser inissível que um julgamento que envolve o ex-Presidente da República não ocorra no Tribunal Pleno”, não somente pela “envergadura do caso”, mas porque a “necessidade deriva da Constituição Federal e do Regimento Interno dessa Suprema Corte”.

“Não há qualquer norma, ainda que regimental, que desloque o julgamento de um ex-presidente para uma das Turmas do Tribunal, como será demonstrado em incidente específico”, ressaltou Vilardi.

Além disso, ele também fez uma série de apontamentos sobre o rito processual de ações que tramitam no STF. Os advogados salientaram que não há instância recursal ou revisional quando se trata de uma processo originário da Suprema Corte e pontuaram que as possibilidades de recurso ao próprio STF são limitadas. Para eles, essa situação torna-se ainda mais preocupante diante das medidas cautelares deferidas monocraticamente, sem debate no colegiado e até mesmo sem a manifestação da PGR.

“A ausência de grau recursal ganha contornos ainda mais preocupantes diante de um processo marcado por medidas cautelares deferidas sempre monocraticamente […] Foram dezenas de buscas e apreensões, quebras de sigilo, cautelares e prisões, todas deferidas antes de iniciada a ação penal. Ainda mais importante, e conforme será adiante detalhado, parte da investigação tramitou, em determinados momentos, sem a participação da Procuradoria-Geral da República e sem o debate no colegiado”.

Ainda nas ponderações sobre as decisões monocráticas, a defesa de Bolsonaro destacou que “também revela que, em diferentes momentos, há uma inegável aproximação do d. Ministro Relator com a figura dos juízes instrutores existentes em tantos outros ordenamentos”.

Defesa reitera que não teve o a todas as provas

Os advogados afirmam que todos os “trechos constantes” no relatório da Polícia Federal e na denúncia “estão, ao menos neste momento, disponíveis”, mas sustentam que “disponibilizou-se apenas os trechos recortados pela Polícia e utilizados pelo Ministério Público Federal”.

“A defesa não possui a íntegra das mídias, o que a impede de conhecer a integralidade da prova e de também selecionar os trechos que são de seu interesse”, diz o documento. Na semana ada, Moraes afirmou que a defesa dos denunciados têm “amplo o” a todos os elementos de prova.

“O processo está sendo iniciado de forma desigual, porque a defesa deveria ter o ao todo e não à parte eleita pela acusação. Depois de muita insistência, há poucos dias vieram aos autos apenas recortes de alguns áudios, colocados em um link criado depois de aberto o prazo para a presente resposta. O recorte disponibilizado serviu apenas para demonstrar que os autos fornecidos não contêm toda a prova produzida”, argumentam os advogados.

Além disso, a defesa questionou o motivo de não poder ter o ao material na íntegra e salientou o que não foi disponibilizado aos advogados do ex-presidente.

“[…] O que não está disponível são as copias dos celulares, das mídias e dos computadores, na íntegra. Não seria razoável que a Defesa pudesse ver toda a troca de mensagens e destacar os trechos do seu interesse? Por que não pode verificar toda a mídia para saber se a denúncia se sustenta? Ou mesmo para poder indicar as suas testemunhas? E como examinar a cadeia de custódia, quando se disponibiliza apenas trechos de interesse da acusação? […]”.

Assinam a defesa de Bolsonaro os advogados Carlos Vilardi, Daniel Tesser, Paulo da Cunha Bueno, Renata Kalim, Luciano De Almeida, Domitila Köhler e Adriana Lima.

Testemunhas indicadas pela defesa de Bolsonaro

A defesa pede a rejeição da denúncia da PGR, mas ressalta que, caso o STF dê continuidade ao processo, Bolsonaro “provará sua inocência por meio da oitiva das testemunhas de defesa abaixo arroladas, em caráter de imprescindibilidade”. 

Amaury Feres Saad;

Coronel Wagner Oliveira da Silva;

Renato de Lima França;

General Eduardo Pazuello;

Senador Rogério Marinho;

Senador Ciro Nogueira;

Governador Tarcísio Gomes de Freitas;

Senador Gilson Machado;

General Marco Antônio Freire Gomes;

Brigadeiro Carlos de Almeida Batista Júnior;

General Júlio César de Arruda;

Jonathas Assunção Salvador Nery de Castro.

Acusação

No dia 18 de fevereiro, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, denunciou Bolsonaro e outras 33 outras pessoas no inquérito que investiga a suposta tentativa de golpe de Estado em 2022. 

A PGR acusa os denunciados pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, organização criminosa, dano qualificado contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

As penas máximas de todos os crimes imputados a Bolsonaro somam 43 anos de prisão. Mas a dosimetria da pena, caso ele seja condenado, só será definida no final do julgamento da ação penal, que ainda não foi aberta. 

Fonte: Gazeta do Povo – Por Camila Abrão e Fernanda Leitoles